sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

A Dura-Ação de Um Minuto


Por muito tempo pensei que a minha raiva o libertaria, e a sentia, muito forte dentro de mim, imaginando que através dela, os seus sentimentos ruins seriam remediados. Pensei que da minha dor, seu sofrimento diminuiria, e julguei poder senti-los sozinha imaginando que você esqueceria os seus.
Durante todo esse tempo eu cultivei problemas meus, seus e nossos, revivi-os tentando achar um caminho para ninguém mais os ter, imaginando que se eu adotasse todos eles, você não mais os teria. Eu cometi erros dantescos com a intenção de cometê-los julgando que você não só os tomaria como lição, mas também, jamais, erraria.
Por muito mais tempo, eu continuei errando. Errei por amar muito e por não saber amar, numa dicotomia louca dentro do angustiante paradoxo do amor, e pensei que a minha imparcialidade o faria muito amado.
Por muitos anos senti um rancor imenso de quem te fazia mal, e julguei que o meu ódio poderia suprimir o seu e que assim você os perdoaria. Eu amargurei minha alma achando que poderia proteger a sua. Durante muito tempo imaginei que os meus esforços poderiam mudar o mundo, o seu mundo. 
Eu abriguei meus sonhos no peito, mas nas ações, nenhuma das palavras sonhadas foram ditas. Eu briguei com a realidade, eu suprimi a verdade, eu tive a pretensão de fazer o bem, julgando saber fazê-lo, e esquecendo-me que de que ele não existe  em absoluto.
Por muito tempo eu achei que teria muito tempo, e ao tentar me encontrar em você, ou alguma parte de mim que fosse sua, eu percebi que perdi todo o tempo. 
Em apenas um minuto eu deixei de pensar, e vi que os olhos enganam. A pele se descolou do meu corpo e minha alma caiu ao chão, inanimada; num desencontro repentino de corpos alheios e sentimentos perdidos na rouquidão do mundo. Descobri a pessoa que deixei de ser, desamparada na memória do que não aconteceu. Vesti ao corpo o vazio do que imaginava crer, sem querer, sozinhos, sabendo apenas agora que o que se imagina não passa do excremento das lembranças do que nunca será vivido.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Entremeio


É um vazio enorme. Vazio da incompreensão, da frustração, do desespero de não estar ao alcance.
É um vazio que não se explica, se sente.
É um choro inútil, uma dor imensa, uma alma em frangalhos. Uma alma que não entende.
É a vida mostrando que traz obstáculos, é ela mudando a rota, mostrando que não há ilusão. 
Seria um passo mal dado, o destino cruzado, ou um castigo por um pecado?
Seria o não entender da filosofia, e todas as expectativas jogadas ao chão do passado. Esperanças vãs para o que não houve perdão.
É o presente agora se fazendo encarar, e a morte súbita do que era esperado.  
É mais que o vazio. É o sublevar dos desejos, a falta do que não se teve; a exposição branda do que realmente importava. A percepção do que nunca mais se terá...
Alheio, o coração doente, o vácuo da ausência de sonhos. 

Lu

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

O Querer


Eu só queria que fosse tudo assim. Eu queria não ter vontade de fazer o que não posso, e fazer tudo o que tenho vontade. Eu queria ter vontade de fazer tudo o que posso e esquecer que da vontade do que nunca poderei. Eu queria fazer sem pensar e pensar sem doer. Eu queria berrar mil vezes vai se fuder, só pelo prazer de berrar, só pela necessidade de extravasar. Eu queria que ninguém olhasse neste momento como se também nunca tivesse tido vontade.
Eu queria só isso. Eu queria que os dias fossem longos apenas quando eu quisesse que fossem, e dormir durante um mês quando os dias se tornassem longos demais para serem suportáveis. Eu queria que as coisas acontecessem do meu jeito, e na hora que eu quisesse, e que chovesse só quando eu pedisse. Eu queria gritar no pôr do sol que é tudo uma merda, e que as pessoas se esquecessem de ser hipócritas, e berrassem comigo que existe aqui muita luta perdida. Eu queria que os sonhos não fossem esquecidos nem trocados pela obrigação.
Eu gostaria apenas que acontecessem dessa forma. Não, não. Eu gostaria que as coisas acontecessem, aliás. Eu queria que não tivesse preconceito no mundo, que as pessoas boas ficassem, que pudéssemos ser amigos. Eu queria menos mistérios. Queria que mulher não tivesse TPM, que homem fosse fiel, que filho não tivesse inseguranças, que pais não pressionassem situações. Eu queria amar num nível de elevado a 100 sem nenhuma explicação, e que aceitassem amar sem explicação. Eu queria que se deixasse de amar no minuto seguinte ninguém julgasse minha ciclotimia.
Eu queria falar sempre eu quero, e que tudo isso fosse atendido do modo como pedisse. E se fosse tudo assim? Eu queria que fosse tudo diferente. 

Eu, Lu

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Disseram-me que a vida curta.

Mas como é que pode?

Se todos os dias eu morro

de tanto rir e tanto chorar?

Se todos os dias eu sofro


de dor e por tanto amar?

Como é que é

e como é que pode,

Morrer assim, só por estar a viver?

E como é que eu vivo

se estou a morrer

a todos os instantes,

de tanto sonhar?

sexta-feira, 18 de março de 2011

Recipiente

Se os seus olhos houvessem me dito
com tal força, deste ódio,
antes eu teria partido
dos seus braços
que me envolviam de carinho.
 
Porém,
só agora descubro
que sentimento vazio
deste ser humano mesquinho,
que a existência me tornou.

E com aquela enorme sensação
de quando transgredia os dizeres,
fiquei a perceber os momentos
deixados no não-fazer dos ditames
que a vida me mostrou sem volta.

Talvez se eu tivesse escutado...
o desejo escondido
nas palavras que vem do silêncio,
eu teria compreendido,
na estrada do amor humano,
que a vida não segue padrão.


Eu, Inês

quinta-feira, 17 de março de 2011

Miscelânea


Se tudo na vida fosse o que esperávamos que fosse, eu não seria eu. Não, mas eu não sou o que penso e nem penso o que sinto. Eu não sou neste instante a pessoa que fui no instante em que passou. Tudo me muda e eu fico surda. Tudo me transforma e eu não vejo nenhuma possibilidade de volta.
Fluxo, fluir, fui. Já não posso mais ser quem gostaria que fosse porque nunca fui nem mesmo quem eu pensava que era. Não, esta ciência acaba com tudo o que eu sinto na mesma medida em que acabam os sentimentos, com o que penso. Nessa miscelânea da vida.
Sim, e eu me transformo no desterro do existir, na metamorfose do elixir que não sabe ainda qual o efeito do feitiço a que veio transmitir. Que não busca o objetivo vão dos que vivem neste encanto. Que não pretende senão isso.
Neste retrocesso da morte, ficamos a pensar em todo o amor que não brotou, a dor do que nunca aconteceu, e na falência dos órgãos, na doce ilusão do que nunca irá acontecer. 

Eu, Raquel